Posso ser demitido por postar algo em rede social?

A polêmica originada pela demissão do jogador de vôlei Maurício Souza do Minas Tênis Clube teve início a partir de um post do atleta no Instagram, no qual comentava uma imagem do Superman beijando outro rapaz.

Conforme consta nos artigos jornalísticos, devido ao teor em tese homofóbico do que foi postado, alguns patrocinadores do clube mineiro ameaçaram a retirar o patrocínio caso o referido clube não demitisse o atleta. Em comunicado, os dirigentes do Minas Tênis Clube admitiram que se viram pressionados a tomar uma providência, ressaltando que a demissão não se relacionou com nenhuma razão pessoal, profissional ou técnica.

Cumpre, então, questionar: pode o patrão demitir o empregado por postar algum comentário na rede social?

A resposta: depende.

Se a demissão for sem justa causa, ela se vincula na conveniência do empregador. A Lei é clara: pagando as parcelas rescisórias, o empregador pode demitir qualquer empregado sem justa causa. É opção derivada do jus variandi e do poder diretivo do vínculo empregatício, ambos institutos bem definidos na doutrina laboral.

Mas este exercício pode, também, caracterizar abuso: se o ato de demissão, ainda que sem justa causa, repercutir negativamente na esfera da pessoa do empregado, este pode pedir uma indenização por abuso de direito (art. 186, Código Civil). Ora, toda pessoa – inclusive os empregadores – devem agir nos limites da Lei, que veda o exercício abusivo de direitos (causando dano a outrem e desvirtuando a finalidade social a que se destinam tais direitos).

Logo, uma demissão injuriosa, punitivista ou que traga repercussões pessoais e sociais ao empregado pode ser discutida; mas estes, são casos limítrofes e raríssimos.

A questão surge mais problemática com a demissão por justa causa: se por um lado, temos o direito do empregado de expor seus pensamentos no ambiente público, por outro, temos o interesse da empresa na manutenção de sua imagem e mercado, este, a razão central de sua atividade.

Em nossa opinião, desde que a fala (i) não seja exercida de forma pejorativa à empresa ou ao ambiente laboral, (ii) não se caracterize como ilícito por si mesmo ou (iii) não seja o empregado figura pública, cujo caráter personalíssimo seja essencial ao contrato, a repercussão não pode resultar na demissão por justa causa.

Ao contrário, se o empregado denigre a empresa, seu mercado ou as pessoas de sua relação de emprego; se comete crimes de injúria (como racismo e homofobia) ou crimes contra a honra; ou se for essencial ao contrato a imagem pública do empregado (caso de artistas e celebridades), a demissão será legal e justa. E, nestes casos, o Judiciário tem sido claro:

O fato é grave, posto que se sabe o alcance das redes sociais, isso sem contar que o recorrente confirma que outros funcionários da empresa também ‘eram seus amigos’ no Facebook. A liberdade de expressão não permite ao empregado travar conversas públicas em rede social ofendendo a sócia proprietária da empresa, o que prejudicou de forma definitiva a continuidade de seu pacto laboral — explicou a juíza Patrícia Glugovskis Penna Martins, relatora de ação no TRT15.

No caso, o trabalhador curtiu a publicação de um ex-colega em que havia críticas dirigidas ao local em que ambos trabalhavam e teria participado de conversas públicas na rede social em que uma das proprietárias foi ofendida. Quando a empresa ficou sabendo, decidiu demitir o trabalhador por justa causa.

Questionada na Justiça, ao final do julgamento, a justa causa foi mantida.

Nestes casos, ainda que vigente o princípio da proteção ao empregado, os interesses do complexo empresarial (que gera também outros empregos), tem prevalência sobre o interesse individual: proteger a empresa é mais importante que o trabalhador, porque os atos ilícitos deste rompem a fidelidade esperada de qualquer contrato e configura ato lesivo à honra e boa fama contra o empregador, o que configura a justa causa, conforme art. 482 da CLT.

Entretanto, fora destes casos e no exercício da liberdade pessoal, o empregado não pode ser demitido por justa causa por post em rede social. O complexo de obrigações de um empregado está vinculado, via de regra, a seu trabalho e sua ética profissional e, não, à sua condição e dignidade pessoal.

Acatar tal entendimento seria macular, tal qual a livre iniciativa das empresas, a liberdade de expressão dos empregados. E qualquer diminuição de liberdade individual (seja para empresas e empregados) deve ser fundamentada na preservação do sistema democrático de liberdades civis; ou seja: uma liberdade só deve ser tolhida se interfere em liberdades alheias, se prejudica o coletivo; sem este requisito, a decisão reflete tirania.

Afinal, podemos não gostar das opiniões alheias, mas devemos defender o direito de dizê-las, para que, no futuro, não sejamos nós os tolhidos.

Empresas devem, assim, idealmente, criar Políticas Corporativas de comunicação em redes sociais, que tem aplicação e aderem aos contratos de trabalho, devendo ser revistas com a participação de representante dos empregados.

Empregados devem, sobretudo, cogitar do alcance midiático das redes sociais, e vislumbrar que seus vínculos profissionais tornados públicos coloca em posição vulnerável o complexo econômico-empresarial para o qual trabalha.

Em todo e qualquer caso, o bom senso é a regra.