É direito da criança autista tratamento especializado pelo Plano de Saúde

Uma criança, representada na Justiça por seus genitores, ajuizou ação contra seu plano de saúde. Ela contou que tem Transtorno do Espectro Autista – Severo e, portanto, necessita de intervenção comportamental, baseada na técnica ABA, em uma clínica que seja próxima à sua residência.

Narra o processo que ela acionou a Justiça após não conseguir ter o tratamento (indicado pelo médico) custeado pelo plano de saúde, como opção terapêutica viável. Assim, em liminar, pediu para que a empresa de saúde fosse compelida a disponibilizar imediatamente o tratamento.

De acordo com o juiz Claudio Salvetti D’Angelo, a recusa ao tratamento indicado pelo médico corresponde à negação à saúde a quem paga pelos serviços com justa expectativa de fruição. Nesse sentido, o magistrado classificou como “indevida”, “abusiva” e “vilipendiosa” a recusa ao tratamento pelo plano de saúde.

“Não pode a operadora de plano de saúde decidir o que funciona ou não para o tratamento do paciente, seu consumidor, no lugar do profissional de saúde, o médico do paciente. É que o médico que atende a autora é quem tem capacidade plena de avaliar o que é necessário para tratamento da patologia diagnosticada, em condição superior ao plano de saúde que recusou-se a liberar o procedimento ou a metodologia de tratamento recomendada. Se há expressa indicação médica para o tratamento do paciente, a recusa pela operadora do plano de saúde é, sim, abusiva. A operadora de plano de saúde pode apenas limitar as patologias cobertas em determinado plano, mas não determinar o tipo de tratamento”.

TJSP. Processo: 1049202-88.2021.8.26.0002

O Magistrado asseverou que a operadora de plano de saúde pode apenas limitar as patologias cobertas em determinado plano, mas não determinar o tipo de tratamento.

Assim, e por fim, o juiz concedeu a liminar para compelir o plano de saúde a autorizar, custear e garantir o tratamento médico indicado a paciente. Em caso de descumprimento da decisão, o magistrado fixou multa diária no valor de R$ 1 mil.

Em casos similares defendidos pelo Escritório, temos visto o deferimento de medidas liminares para o custeio de tratamentos especializados a pacientes com TEA: os Planos de Saúde, na maior parte das vezes, concedem o tratamento de forma fragmentada, sem especialização, com restrições à marcações de consultas e tipos de atendimento, fazendo o que podem para não permitir um tratamento continuo, típico e especializado.

Thiago Araújo, psicólogo pela Universidade do Quebec, no Canadá, e formador oficial ESDM: “Intensidade é palavra chave quando se fala em intervenções para crianças com autismo. Independentemente do método ou da abordagem escolhida pelos pais, a grande maioria dos especialistas defende que, quanto mais tempo a criança passar nas terapias, maior o ganho em desenvolvimento”.

A lei 9.656/98, que dispõe sobre planos e seguros saúde, determina cobertura obrigatória para as doenças listadas na CID 10 – Classificação Estatística Internacional de Doenças e de Problemas Relacionados à Saúde, que trata-se de uma relação de enfermidades catalogadas e padronizadas pela Organização Mundial de Saúde.

A CID 10, no capítulo V, prevê todos os tipos de Transtornos do Desenvolvimento Psicológico. Um destes é o Transtorno Global do Desenvolvimento, do qual o autismo é um subtipo. Da mesma forma, a lei 12.764 de 2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, prevê em seus artigos 2°, III e 3°, III, “b” a obrigatoriedade do fornecimento de atendimento multiprofissional ao paciente diagnosticado com Autismo.

Vale ainda mencionar os artigos 15 e 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que garantem o direito ao respeito da dignidade da criança, bem como a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral.

Verifica-se com propriedade que o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde de 2018, da ANS, impõe o reconhecimento de um tratamento especializado, sendo dever das operadoras de planos de saúde garantir, no mínimo 96 sessões/ano (1,8 sessões semana) com fonoaudiólogo e 40 sessões/ano Psicólogo/Terapeuta Ocupacional.

Apesar de ainda restar a consolidar a jurisprudência quanto ao emprego de técnicas e métodos para o tratamento, como ABA e Denver, a Justiça tem garantido aos pacientes e seus familiares acesso a tratamento especializado e compelido os planos de saúde a custear os tratamentos especializados em sua rede própria ou de terceiros, caso não exista tratamento especializado na rede própria.

Desse modo, considerando que os contratos que regem a relação dos Planos de Saúde entre tratam-se de típicos contrato de adesão, em que o consumidor tem pouca ou nenhuma liberdade de pactuar as cláusulas avençadas, resta claro que, encontrando-se sob a égide do Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90), é perfeitamente lícito aferir-se eventual abusividade destas condutas.

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