- 04/11/2021
- Posted by: Fausto Sette Câmara
- Category: Direito do Consumidor

Uma criança, representada na Justiça por seus genitores, ajuizou ação contra seu plano de saúde. Ela contou que tem Transtorno do Espectro Autista – Severo e, portanto, necessita de intervenção comportamental, baseada na técnica ABA, em uma clínica que seja próxima à sua residência.
Narra o processo que ela acionou a Justiça após não conseguir ter o tratamento (indicado pelo médico) custeado pelo plano de saúde, como opção terapêutica viável. Assim, em liminar, pediu para que a empresa de saúde fosse compelida a disponibilizar imediatamente o tratamento.
De acordo com o juiz Claudio Salvetti D’Angelo, a recusa ao tratamento indicado pelo médico corresponde à negação à saúde a quem paga pelos serviços com justa expectativa de fruição. Nesse sentido, o magistrado classificou como “indevida”, “abusiva” e “vilipendiosa” a recusa ao tratamento pelo plano de saúde.
“Não pode a operadora de plano de saúde decidir o que funciona ou não para o tratamento do paciente, seu consumidor, no lugar do profissional de saúde, o médico do paciente. É que o médico que atende a autora é quem tem capacidade plena de avaliar o que é necessário para tratamento da patologia diagnosticada, em condição superior ao plano de saúde que recusou-se a liberar o procedimento ou a metodologia de tratamento recomendada. Se há expressa indicação médica para o tratamento do paciente, a recusa pela operadora do plano de saúde é, sim, abusiva. A operadora de plano de saúde pode apenas limitar as patologias cobertas em determinado plano, mas não determinar o tipo de tratamento”.
TJSP. Processo: 1049202-88.2021.8.26.0002
O Magistrado asseverou que a operadora de plano de saúde pode apenas limitar as patologias cobertas em determinado plano, mas não determinar o tipo de tratamento.
Assim, e por fim, o juiz concedeu a liminar para compelir o plano de saúde a autorizar, custear e garantir o tratamento médico indicado a paciente. Em caso de descumprimento da decisão, o magistrado fixou multa diária no valor de R$ 1 mil.
Em casos similares defendidos pelo Escritório, temos visto o deferimento de medidas liminares para o custeio de tratamentos especializados a pacientes com TEA: os Planos de Saúde, na maior parte das vezes, concedem o tratamento de forma fragmentada, sem especialização, com restrições à marcações de consultas e tipos de atendimento, fazendo o que podem para não permitir um tratamento continuo, típico e especializado.
Thiago Araújo, psicólogo pela Universidade do Quebec, no Canadá, e formador oficial ESDM: “Intensidade é palavra chave quando se fala em intervenções para crianças com autismo. Independentemente do método ou da abordagem escolhida pelos pais, a grande maioria dos especialistas defende que, quanto mais tempo a criança passar nas terapias, maior o ganho em desenvolvimento”.
A lei 9.656/98, que dispõe sobre planos e seguros saúde, determina cobertura obrigatória para as doenças listadas na CID 10 – Classificação Estatística Internacional de Doenças e de Problemas Relacionados à Saúde, que trata-se de uma relação de enfermidades catalogadas e padronizadas pela Organização Mundial de Saúde.
A CID 10, no capítulo V, prevê todos os tipos de Transtornos do Desenvolvimento Psicológico. Um destes é o Transtorno Global do Desenvolvimento, do qual o autismo é um subtipo. Da mesma forma, a lei 12.764 de 2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, prevê em seus artigos 2°, III e 3°, III, “b” a obrigatoriedade do fornecimento de atendimento multiprofissional ao paciente diagnosticado com Autismo.
Vale ainda mencionar os artigos 15 e 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que garantem o direito ao respeito da dignidade da criança, bem como a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral.
Verifica-se com propriedade que o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde de 2018, da ANS, impõe o reconhecimento de um tratamento especializado, sendo dever das operadoras de planos de saúde garantir, no mínimo 96 sessões/ano (1,8 sessões semana) com fonoaudiólogo e 40 sessões/ano Psicólogo/Terapeuta Ocupacional.
Apesar de ainda restar a consolidar a jurisprudência quanto ao emprego de técnicas e métodos para o tratamento, como ABA e Denver, a Justiça tem garantido aos pacientes e seus familiares acesso a tratamento especializado e compelido os planos de saúde a custear os tratamentos especializados em sua rede própria ou de terceiros, caso não exista tratamento especializado na rede própria.
Desse modo, considerando que os contratos que regem a relação dos Planos de Saúde entre tratam-se de típicos contrato de adesão, em que o consumidor tem pouca ou nenhuma liberdade de pactuar as cláusulas avençadas, resta claro que, encontrando-se sob a égide do Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90), é perfeitamente lícito aferir-se eventual abusividade destas condutas.
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